7.3.10

o voyer.


às vezes fico impressionada com a capacidade de poder me enxergar melhor à distância.

ser voyer de si mesmo é exercício de passos largos,
é ter os olhos no frio.

6.3.10

no name

nobody can call me by my name é o nome de uma obra que eu vi na primeira bienal do mercosul a qual fui. devia ser a segunda, creio que eu tinha uns 16.

visualmente, a obra tinha algo de tosco e displicente.
no entanto, o nome me atingiu como um raio: certeiro e profundo.
e até hoje não sei explicar o porquê.

talvez o fato de lidar com algo inominável, pelo sentido e no contexto em que me atingiu; ou pela força da imposição: ninguém pode me chamar pelo meu nome, me deixasse num misto de paralisia e fascinação.
um nome destes, ironicamente, me parecia ter um tom muito pessoal, apesar da obra se constituir de algumas esculturas repetidas, sem forma definida.
o título, soava como uma voz vinda por trás dos meus ouvidos: você não pode me chamar. sou um raio distante, indescrítível, intangível. cegante.

curiosamente, nunca tive uma necessidade de me entender com isto. como se a força desta obra residisse no fato de não compreendê-la por completo.
é pela força desta onda que eu ainda lembro, a incompreensão que ainda repercute em mim.

...

existem alguns fatos e pessoas que passam pela nossa vida com esta mesma força: paralisia, fascinação e incompreensão.
a tentativa de elucidá-los os torna mais fortes.
a capacidade de estar em paz com eles me provoca um sorriso no fundo dos olhos.


no fundo, eles não podem me chamar pelo meu nome.
não me conhecem.
e curiosamente, é pela incompreensão que os conheço tão bem.



nobody can call me by my name




1.3.10

o equilibrista.


não saber como ficar no meio caminho entre o amor e o não-amor é como não saber as instruções para perder-se.
é estar errante na neblina, que torna todas as paisagens as mesmas.
no entanto, podem ser os olhos embaçados...

pena para o equilibrista.
passos lentos e calculados que não permitem a gravidade da densidade.
e sempre cruzando, acaba chegando ao destino que é o mesmo do ponto de partida.

a ideia de voltar nada tem de estimulante.
melhor descer as escadas, exercitar a sagacidade.
descendo, terei muitas ruas para cruzar,
e ficarei triste pois as tentativas nada têm de arriscadas.
Aparentemente.


Atenção:
caminhante invisível caça indisfarçáveis grãos de areia para carregar.

Depois, enquanto equilibrista, irá despedir-se lentamente dos grãos.
Não porque a praia o agrade,
[os oceanos lhe acalmam, só que por vezes causam uma melancolia profunda]
mas porque ela pode lhe escapar aos poucos.


até logo, Vila-Matas


Porque rir do mundo, que pode ser tosco e trágico ao mesmo tempo, é necessário:

- Você está indo pelas beiradas, que é onde vão parar as vulgares e as más paraquedistas.
Anda, lembre-se de onde estava. Volte atrás.

Havia uma ameaça de tempestade no ambiente, e a paraquedista foi obrigada a uma queda vulgar.
que fazer?
quem sabe busco a elegância na distração, que é também limbo do bom-senso.
e me voy a rir.


Enrique Vila-Matas
trechos do conto Os amores que duram por toda uma vida.
Suicídios Exemplares, Cosac Naify, 2009.