25.12.10

Licença poética.


Colocar a música Indifference* no volume mais alto,
com as janelas do quarto bem abertas,
nesta tarde quieta de 25 de dezembro.


* Indifference: última canção do album V.S., Pearl Jam.
http://listen.grooveshark.com/#/album/Vs/139056

I will light the match this morning
so I won't be alone
watch as she lies silent
for soon that will be gone
oh, i will stand arms outstretched
pretend i'm free to roam
oh, i will make my way through
one more day in hell

How much difference does it make?
how much difference does it make?

I will hold the candle
until it burns up my arm
oh, i'll keep taking punches
until their will grows tired
oh, i will stare the sun down
until my eyes go blind
hey, i won't change direction
and i won't change my mind

How much difference does it make?
how much difference does it make?

I'll swallow poison
until i grow immune
i will scream my lungs out
till it fills this room

How much difference...
how much difference...
how much difference does it make?
how much difference does it make?



12.12.10

A não-natureza.


1 - Trabalhar nas coisas mais espontâneas.

2 - Felicidade não é busca nem encontro, é exercício.


o estrangeiro mais íntimo.


Nunca o vi e,
quando o vi,
mal enxerguei.

No entanto ele me viu, mesmo,
e fez questão de opinar:
- tu está bem longe daqui, não é?

[o tom da sua voz confirmava que não era nenhum disparate.
o tom da sua voz me tocou físicamente, me chamando de volta à realidade.]

- sim, não estou aqui.
... e não fiz questão de voltar, permanecendo na viagem.

o silêncio e a verdade compartilhada foram de uma intimidade tal,
que eu não compartilhava havia anos...

...

...
quando cheguei em casa, me tornei uma pessoa completamente diferente.



9.12.10

Acerca de Crisis Blues.


O silêncio tem o poder de uma falsa neutralidade.
Se me recuso a falar, estou me recusando a algo?

Silêncio é também ausência.

silêncio, ausência, desaparecimento, fuga.
..
Optar pelo silêncio é similar ao gesto de ir embora.

...

Por outro lado, dizer não é movimento, atividade.
Subo no palco para dizer: no no no no no.

Dizer não, em certas circunstâncias, requer uma energia sagaz.
Não estou correndo para lugar algum,
pretendo ficar bem aqui.



8.12.10

Crisis Blues





* ícones de referência:
1 - The Residents, na canção N - Er - Gee (Crisis Blues), em 1'45"
2 - Human Beinz, com a canção Nobody But Me
3 - The Office, na abertura Lip Dub (1º espisódio, 7º temporada)


Crisis Blues 2


Se saio na rua, não vejo ninguém.
Se fico em casa, vejo outros tantos, me perco neles.

...

Música é delírio.
Escrever é correr pelas estradas.


12.11.10

o observador




Recentemente participei de um projeto com uma fotografia.
Produzi algumas, e no fim fiquei bastante indecisa entre duas delas.
[parecidas, diferem entre si apenas pelo grau de exposição].

Continuo indecisa.
Então, como um gesto de reparação, publico a foto anteriormente ignorada.
...

Acho-a mais silenciosa.
Como se um véu escondesse toda sua intenção.

2.11.10

uma holografia.


Dos cotidianos absurdos:


Alguém ou algo [???] publicou no facebook [em meu lugar] o seguinte status: "in love"


uma imagem: amigos te assaltando com perguntas sobre uma suposta história escondida, não revelada.

[o que não existe pode provocar risos].


sentimento 1 - gente, o que é isso?

2 - [sensação de insegurança ao perceber a fragilidade da identidade enquanto imagem]

3 - rebeldia delicada: uma subversão que poderia ser para qualquer outra coisa, mas é algo para o amor.

4 - então vou deixar assim, não vou tirar dali.


Uma cena das coisas não realizadas:

5 - encontrar um post falso como se você possuísse uma holografia não autorizada é oposto do deserto.

6 - o vazio é o deserto. o preenchimento cheio de vazio não é exatamente o oposto.

7 - existe um terceiro oposto, não estamos em lugar nenhum.


8 - é uma alegria criar a partir das coisas falsamente vazias.



9.10.10

Hibernar


Às vezes, tenho a sensação de que passei estes anos todos dormindo.

Todos os dias testo uma nova forma de acordar.


Mas às vezes, receio cair no sono profundo tão espontaneamente quanto acordei.
[estarei de fato acordada neste momento?]

Receio os cochilos,
o hábito de dormir sem perceber.

No entanto, não se vive o tempo todo acordado.

Desejo o sono como gesto de liberdade,
o labirinto do sono como caça-palavras,
desperta como água fria no corpo.


25.9.10

os sonhos que abandonaram Buñuel


Disse ele:
como fazer para reeditar um sonho perdido?

Buñuel tem sonhos que duram anos.
Alguns parecem que estão ali desde sempre,
e alguns destes, o abandonaram.

sem despedida, sem porquês.
...
Algumas coisas já passaram, e eu não preciso mais sonhar com elas.

..................................

Outra frase que me agrada:

Vive-se no interior de si mesmo. As viagens não existem.

Sonhar é viajar no interior de si mesmo
e beira o assustador como alguns sonhos mostram-se reveladores.

E quando sobram apenas pequenas reminiscências desconexas,
que fazer?
O abismo se abre diante da impotência de desvendar o sonho.

É fácil não se importar, em breve serão esquecidos.
Lembrar e esquecer, rotina de todas as noites.

...

E se acordamos já no esquecimento?
Se o dia amanhece angustiado, com a falta das memórias que não vivemos...
como resolver o que não lembramos?

E se pertencem ao esquecimento, qual a razão do vislumbre breve, esmaecido e fugidio?

As rápidas lembranças matinais são saudade.
São o sentimento de falta.

Incompleta, durmo mais uma vez.
Os sonhos raramente são os mesmos, e terei novas saudades pela manhã.

...
O sonho repetido é obssessão.
É falta que insiste,
lembrança incompleta que não se perde.


21.8.10

correr.


importa mais a questão:
de onde estou correndo,
ou para onde estou correndo?

...
fugir é caminho para encontrar?

talvez, o importante mesmo seja estar correndo.
a vida é busca, é nela que eu corro.


15.8.10

retroprojetar


Tenho um desejo que virou minha sombra.
Com o sol logo atrás, acabo sempre caminhando sobre ela.

O desejo como sombra é algo que não se consegue esquecer.

Sempre nos acompanha,
e nunca é palpável
nunca se torna real.

O desejo como sombra também é algo que nos segue.

Possuímos afinidades e prefere a minha companhia mais do que todas as outras.

Mas sua matéria é outra,
o encontro é desarticulado.
[se o encontro é desarticulado, seria realmente um encontro?]

...

Como abandonar a sombra?

Desejo ficar debaixo do sol a pino,
quente e cegante.

Depois de cega, verei tudo em branco.
As sombras serão apenas contornos cinzas e distantes.

Se eu não enxergar o desejo, ele simplesmente não estará mais ali.

Terá se convertido em outros tantos.
sombras brancas e delicadas de orvalho.
gotas que caem nos meus olhos enquanto estou dormindo.
água do rio que irei nadar depois de atravessar o deserto.


projetos de insistência 2


Se a insistência muda de lugar,
ainda é insistência?

8.8.10

marcar encontros.


Uma amiga* possui um trabalho que envolve a ideia de encontros geográficos impossíveis:

É um trabalho que desde o primeiro esboço me impressionou e,
como penso muito nos encontros,
torna-se uma experiência de ideia como o mar, que vai e vem.

...

Certas músicas de Mark Lanegan* me transportam diretamente para o deserto.
E sempre penso nos desertos
[na ideia de deserto, e de fronteiras]
de Win Wenders.


Proponho como arte a prosposta de um encontro:
entre os desertos de Win Wenders e Mark Lanegan.


* http://margensdapalavra.blogspot.com
* Escute: Ressurection Song, Field Song e Fix, do album Field Songs.

3.8.10

para Buñuel, sobre a memória


... "Em contrapartida, preocupa-me muito, chego a me angustiar, quando não consigo me lembrar de um fato recente que vivi, ou então do nome de uma pessoa conhecida nos últimos meses, ou mesmo de um objeto. Subitamente minha personalidade se desmorona, se desarticula. Não consigo pensar em outra coisa e, ainda assim, todo o meu esforço, toda a minha raiva são inúteis. Será o começo de um ofuscamento total? Sensação atroz, ter que usar uma metáfora para dizer 'uma mesa'. E a mais horrenda e pior das angústias: estar vivo, mas não reconhecer a si próprio, não saber mais quem se é.

[...]

Indispensável e onipotente, a memória é também frágil e vulnerável. Não é apenas ameaçada pelo esquecimento, seu velho inimigo, como pelas falsas recordações que dia após dia a invadem.
[...]
A memória é perpetuamente invadida pela imaginação e o devaneio, e, como existe uma tentação de crer na realidade do imaginário, acabamos por transformar nossa mentira numa verdade. O que, por sinal, tem apenas importância relativa, já que uma e outro são vividos, ambos igualmente pessoais."

* Luis Buñuel (com escrita do querido Jean-Claude Carriere) em:
Meu último suspiro, ed. Cosac Naify, 2009.

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Sempre acreditei na ilusão como arma poderosa do viver.
A gente vive de acordo com o que acredita, e podemos realmente viver longamente numa história criada.

Mas isso todo mundo sabe, não?
Então, qual a importância desta discussão?

Como boa parte dos meus questionamentos em criação escrita, não desejo chegar num ponto de vista que se torne denominador comum para quem quer que reflita algo a partir daqui.

e hoje não quero argumentar, só afirmar:

ilusão é espaço de vivência.

[e de cantinho, posso ainda me perguntar:]
onde viver com a ilusão?
qual o espaço/ lugar deste viver?

a força com que vivo uma ilusão é a mesma de caminhar todos os dias.


19.7.10

I'm a victim of this song *


Não sei dizer o que me afeta mais no trabalho de Pipilotti Rist:
Os vídeos já são algo tanto densos
[e contém o aúdio, talvez ainda mais marcante],
Os títulos...
uma frase que fala de um corpo de trabalho,
e de um corpo de sentimentos em mim.

ser vítima daquilo que assistimos como algo que nos afeta interiormente.
irradiando de um ponto para todo o resto.
o estranhamento como arma que perfura.
hoje começou nos tímpanos,
e percorreu lentamente todo o sistema sanguíneo.

começou me fazendo pensar que sou exatamente o oposto do que ela prega:
[e no entanto me reconheço tanto nas imagens]

I'm not the girl who misses much*

[...]
quando olho para a espera,
torturando-me na espera que não precisa existir
que é menos real do que faço ser...

porque insistimos em certas expectativas que sabemos não serem importantes?

o que isso denota?

penso que quando olhamos tanto para algo que não importa "tanto assim"
algo mais importante falta para ocupar aquele preciso lugar.
...
para se ocupar um lugar preciso é preciso possuir certas características específicas.

então, enfim, há alguma importância.
nem que seja a seta que indica um vazio.

I'm a girl who misses much.
but not "the" girl.

e às vezes, posso bem ser como ela.
[aquela que insiste: I'm not...]

......................

Pipilotti Rist também canta Wicked Game.
sem voz apropriada,
e a voz de uma criança canta que gritando.
que canta com as entranhas,
canta alto para ser ouvida.
ou para se ouvir.
como se o grito fosse a afirmação mais firme.

And I wanna fall in love
No, I don't want to fall in love
With you
...
I never dreamed that I'd love somebody like you
I never dreamed that I'd lose somebody like you

...
não me parece necessário desvendar o sentido de uma criança cantando uma canção de amor.
interessa o grito
alto para ecoar o universo
alto a quase rasgar-lhe por dentro.

sim,
sou vítima desta canção
e de tantas outras mais.


* Títulos de trabalhos em vídeoarte de Pipilotti Rist.

12.7.10

projetos de insistência


Tenho vários, desejo outros tantos.
insistência é estratégia de chegar.

Insistência é dizer sim para a ilusão.


11.7.10

o encontro e a perda.


"No fundo, Resnais nos diz que amar é estar pronto para amar de novo e o amor, a perpétua iminência de seu re-encontro e de sua perda".

* Enéas de Souza, no artigo Do horror à beleza do cinema,
revista Teorema, agosto de 2009.

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fiquei pensando que amar é um gesto assim, algo libertário.
é de fato uma entrega. como um salto.

porque quando estamos prontos para perder, estamos livres.

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"penso que te amo" - dizia o autor, em outro momento.

pensar, e não o sentir.
desejo de sentir.

quantas vezes já não ouvimos falar em "amar o amor"?
ou seja, amar a ideia de estar amando, e não uma pessoa em especial.
...

quantas vezes o amor não é nada além desse encontro, do desejo de uma vontade,
e a pessoa amada, uma coincidência?

viver o amor é o encontro de duas vontades.
...

e se o amor é um encontro,
e é também um jogo,
como se joga com o encontrar?

encontro é por vezes um estado, não um lugar.
e desejo é percurso.

se joga caminhando no desejo, o percurso é limbo.
porque as vontades são frequentemente nebulosas:
[embaçado que muda com os dias]
formada por pequenas vontades menores, que vão e vêm.
formada de enganos e ilusões.
de acertos, erros e de coragem.

caminhar o percurso do desejo é andar em linha fina.
e segurando a vara do equilibrista raramente olho para os lados.
mantendo-se o foco, chega-se a um ponto, não?

mas quando chegar, como saber se era o ponto do desejo,
ou se eu não queria outras linhas, viver numa teia?

[mas qual seria o sentido de viver sem a busca de encontrar?]

bem, talvez chegando deseje voltar.
[não para o lugar de partida, pois não se pode voltar atrás no viver]
mas tornar o quase mesmo percurso em outro.

viver o desejo nebuloso
viver encontro nebuloso.
névoa que clareia aos poucos.
dia que nasce devagar em vários dias.