9.6.12

no deserto é calor

e é tão dolorido quanto o frio.

o frio que exige tantos preenchimentos, tantas cobertas, tantas camadas.
tantos apegos, tantos confortos, tantas distrações...

todas as coisas sem as quais não consigo viver. todas as tramas que construí no meu cobertor.

cobertor - tramas - mesh-points - paisagem enredada de viver.

...
no calor, tudo é excesso.

tudo igualmente pesa.
peso-conforto-peso-desconforto.

no deserto é frio e calor como é noite e dia todos os dias.

[sinto falta de tudo para o que digo adeus].

no calor é difícil mover-se como no frio.
e no entanto, nos movemos.
nos movemos como se caminhando pudéssemos fugir do calor.

porque o deserto, se atravessa de dia.

enquanto sinto calor.
enquanto posso me despir de tudo o que pesa.
enquanto tenho força para atravessar o deserto todos os dias.

...
todos os dias infinitos do deserto vivem para ser atravessados, tudo o que me cobre me protege deserto de viver, todas as coisas mais amadas na vida merecem ser perdidas e recuperadas, todas as coisas merecem ser perdidas como quem protege o seu amor no fundo da memória, todo o deserto é grande demais pra ser atravessado com o peso das memórias, das densidades amorosas, dos escapismos rasos. EM TODO O DESERTO FAZ CALOR E EU SÓ POSSO ATRAVESSÁ-LO COM O DESEJO. no deserto o desejo faz calor e é por isso que eu não preciso de mais nada. vou me despir de todas as camadas na direção do desejo.



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